6.9.04

A parteira.

Curandeira, parteira da aldeia, mulher possuidora de conhecimento sobre ervas e sobre o tempo, personificação das forças do inconsciente, arquétipo da mulher selvagem ou La Belle Dame Sans Merci , a feiticeira é uma personagem importante na história da humanidade. Envolta em eterna bruma, escondida na floresta ou numa casa escura e pobre longe da aldeia, ela desafia a ordem imposta.
As crescentes distorções da imagem da feiticeira, que a colocam como parceira e amante do diabo, desvelam a vontade da sociedade patriarcal em subjugar a dinâmica das eras matricêntricas. Nos tempos pagãos, os ritos e cultos estão associados à magia do corpo feminino gerador da vida, simbolizando a transcendência e o mistério. O corpo é, então, a personificação das energias da natureza e de tudo quanto lhe diz respeito.
Toda a natureza assemelha-se com a mãe: a terra é mulher e na mulher habitam os poderes que na terra existem.
A mulher era vista como musa inspiradora da vida carnal e espiritual. Seus atributos englobam, além da magia e da sabedoria, a maternidade e a fertilidade. Doadoras da vida e detentoras da morte, elas pagam um preço alto nas sociedades patriarcais que se consolidarão. Com o estabelecimento da agricultura e domesticação de animais, começa a haver uma diferenciação de papéis sociais, dando lugar a algo inteiramente novo.
Quando a humanidade alcançou o estágio de escrever seus mitos e suas leis, o patriarcado já estava definitivamente estabelecido: os homens é que escreveriam os códigos. Dos poderes ambivalentes anteriormente investidos na mulher, os aspectos malignos é que foram retidos: uma vez sagrada, ela torna-se impura; Eva, dada a Adão para ser sua companheira, torna-se a ruína da humanidade...
É importante lembrar que foram necessários vários séculos para que o homem abandonasse suas antigas crenças nas deusas e deuses pagãos e se voltasse completamente para o Deus único. No paganismo, as divindades se aproximavam da humanidade através de suas ações passionais e seus pólos negativo e positivo. Não havia distância entre o fasto e o nefasto, entre o profano e o sagrado. No processo de assimilação dessas crenças pagãs pelo cristianismo, as características ambivalentes, mas não excludentes, foram dicotomizadas.
Na época da Caça às Bruxas, a Igreja explica os males do mundo como conseqüência da falta de servidão ao Deus único. Liga a sexualidade ao demônio; o demônio à bruxa; a bruxa à mulher e a mulher à morte. À transgressão sexual passa a ser equivalente a transgressão da fé. A sexualidade e o prazer são duramente normatizados. A intuição, a magia, a sensualidade e a sabedoria feminina tornam-se marginais, transformando-se em elementos do mundo infernal.
As bruxas, antigas Deusas, eram um fator de ameaça em potência. Ao confundir-se com o sagrado, a mulher expressa um poder que a sociedade, o processo de civilização, tenta dominar. A face da Deusa não foi só demonizada e fragmentada. Foi substituída por um Deus masculino e abstrato que absorveu seu pólo positivo e renegou o negativo. O portador da lei, o juiz, como fonte de sentido e das regras para a organização da vida social, nesta como em outras sociedades, tem o rosto masculino.
É essa mesma voz que dita as regras e normatiza, conforme sua vontade, a sexualidade feminina. É ela que molda a imagem da mulher, que diz como ela deve agir e pensar. A ferocidade feminina, a bruxa parteira, a mulher-loba, o útero dentado insaciável, a bruxa voraz que devora criancinhas, deve ser domada e reconhecida como fonte da maldade
Assim como as antigas Deusas vinculavam-se com a natureza, detendo o poder das transmutações e transformações (a exemplo de Circe), as bruxas eram capazes de criar ilusões, voar ou transportar-se para grandes distâncias, transformar-se em, e dominar animais, principalmente aqueles ligados à noite, e controlar certas funções corporais, especialmente aquelas ligadas ao ato carnal.
O auge de suas manifestações era o Sabá, ou a Missa Negra, geralmente realizado em clareiras de florestas. Com a permissão de Deus, os Sabás eram a inversão da Santa Missa, onde o demônio era adorado. Festas macabras onde se cozinhava carne de inocentes crianças, as bruxas, em transe, dançavam freneticamente e copulavam com o demônio. Rituais de sexo e luxúria, os Sabás lembram as antigas festas pagãs que celebravam a colheita e as famosas Bacanais gregas.
É importante salientar que os instrumentos tipicamente femininos, como a vassoura e o caldeirão, também foram satanizados. O conteúdo deste é repugnante, e objeto de fascínio para muitos escritores.
Combatendo o poder temporal, a Igreja tornou-se ela própria sedenta de riquezas mundanas. A Inquisição tornou-se verdadeira máquina industrial, empregando carcereiros, escribas, juízes, verdugos e exorcistas. Para proteger seu crescente poderio, leis como o celibato e a obrigatoriedade do casamento antes da relação sexual foram adotadas.
Todos aqueles que testemunhassem "em nome da fé" contra uma pessoa supostamente herege, recebia uma parte de suas propriedades e riquezas, caso houvesse condenação. Além da Igreja, a profissão médica também se beneficiou com a Inquisição. As curandeiras, parteiras e boticárias que ofereciam uma medicina alternativa àquela praticada nas universidades foram duramente perseguidas e seu saber foi perdido ou assimilado.
Cessada a Inquisição, a imagem da feiticeira como ser maligno e ajudante do diabo há muito se consolidara. A mulher, reduzida ao espaço doméstico e sofrendo limitações até dentro desse espaço, torna-se ou o "Anjo da Casa" ou "A Louca do Sótão", mulher histérica e perigosa. O orgasmo e a ambição feminina obviamente "coisas do diabo" são passíveis de punição por parte da sociedade masculina e das próprias mulheres.
Assim foi feito até os nossos dias em que somos defrontadas com uma sociedade machista na qual devemos mudar os rumos .

Um comentário:

  1. Anônimo8:04 PM

    muito bom esse texto, vc q escreveu Darlana? ótimo mesmom mto elucidativo, congratuilations!
    :o* da
    Silvinha (Itu/SP)
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